Fonte: Revista Época
Relatório da Oxfam de 2018 mostra que 82% da riqueza mundial gerada em 2017 ficou com 1% da população
Os cinco homens mais ricos do Brasil tem riqueza equivalente à metade da população mais pobre do país. Isso quer dizer que Jorge Paulo Lemann, Joseph Safra, Marcel Herrmann Telles, Carlos Alberto Sicupira e Eduardo Saverin tinham juntos a mesma quantia do que cerca de 100 milhões de pessoas. Em 2017, o país ganhou mais 12 bilionários, que agora somam 43 pessoas. A fortuna desses super ricos chega a US$ 549 bilhões, ou 43,52% da riqueza do país. Enquanto isso, a metade mais pobre da população brasileira controlava apenas 2% da riqueza nacional, menos do que os 2,7% de 2016.
Os números são da Oxfam, confederação de ONGs presente em 94 países, que trabalha para a redução da desigualdade.
“O aumento da desigualdade é uma tendência global, e o Brasil tem seguido essa tendência”, afirma Katia Maia, diretora-executiva da Oxfam no país. “A economia segue sendo muito boa para quem já tem muito e péssima para quem tem pouco”, diz ela.
No mundo, 82% de toda a riqueza gerada em 2017 ficou nas mãos do 1% mais rico da população, enquanto 3,7 bilhões de pessoas não obteve nada. Ao longo dos últimos 25 anos, enquanto o 1% mais rico capturou 27% do crescimento da renda global, mas a metade mais pobre do mundo ficou com 13% de cada dólar inserido na economia. Mantendo o mesmo nível de desigualdade, a economia global precisaria crescer 175 vezes para permitir que todos passassem a ganhar mais de US$ 5 por dia. A Oxfam publica anualmente um relatório na semana em que acontece o Fórum Econômico Mundial. O tema desse ano é “recompensem o trabalho, não a riqueza”.
No ano passado, houve um aumento histórico da quantidade de bilionários. “Esse número cresceu de forma muito impressionante em 2017, a cada dois dias surgiu um novo bilionário”, afirma Katia.
O grupo de pessoas com mais de US$ 1 bilhão reúne hoje 2.043 pessoas, sendo que 90% delas são homens. E segundo os dados da Oxfam, a concentração de riqueza tem aumentado nos últimos anos. Enquanto a fortuna dos bilionários cresceu 13% por ano desde 2010, o salário dos trabalhadores aumentava, em média, 2% ao ano, e mais da metade da população vive com renda entre US$ 2 e US$ 10 por dia (entre R$ 6 e R$ 32, aproximadamente).
Crise e reformas no Brasil
Mesmo com a crise econômica no Brasil, o patrimônio dos bilionários cresceu, em média, 13% em 2017. “Isso mostra que a crise não afeta aqueles que estão no topo do topo. Em compensação, aquelas que estão na base da pirâmide são afetados pelas medidas que estão sendo tomadas para enfrentar a crise”, afirma Katia. A redução de gastos públicos, por exemplo, prejudica mais a população mais pobre, que depende mais dos serviços públicos como saúde e educação.
As perspectivas não são boas para os próximos anos. A reforma trabalhista, diz a diretora-executiva da Oxfam Brasil, “coloca exatamente os elementos que o relatório menciona como causadores da desigualdade, como a terceirização, flexibilização extrema das condições trabalhistas, redução do espaço sindical e de direitos dos trabalhadores”.
Mudanças necessárias
Para a Oxfam, apesar de o tema da desigualdade ser discutido há anos sem sucesso, isso não quer dizer que não haja uma solução para o problema. Segundo Katia, há muito que poderia ser feito mesmo nas empresas. “Na busca por aumentar os lucros e dividendos para remunerar os acionistas, as empresas vêm em um crescente de precarização do trabalho e redução de salários”, diz ela. “O que sugerimos é que a distribuição de lucros só ocorra quando todos os trabalhadores tenham salários dignos”.
Para reduzir a concentração de renda, a Oxfam defende que as empresas deveriam olhar também para suas próprias políticas de salário. “Existem empresas no mundo cujos diretores ganham entre 300 e 400 vezes mais do que salário médio. Nós pensamos que o ideal seria algo em torno de 20”, diz Katia. “As empresas pensarem na situação dos trabalhadores não é serviço social. Essa desigualdade extrema é ruim para o sistema produtivo”.
Para a Oxfam, a terceirização também contribui para o agravamento da desigualdade, porque as empresas deixam de se responsabilizar pelas condições de trabalho de seus funcionários. A estimativa é que as 50 maiores empresas do mundo tenham juntas 116 milhões de trabalhadores terceirizados, o que representaria 94% de sua força de trabalho. “As empresas se eximem das responsabilidades com 94% das pessoas que trabalham para que elas possam vender seus produtos”, afirma Katia.
Os governos também têm um papel importante na redução das desigualdades, e deveriam promover políticas fiscais e tributárias com essa questão em mente. Combater a evasão e sonegação, nesse sentido, seria um ponto importante. A Oxfam estima que um imposto global de 1,5% sobre a riqueza dos bilionários poderia cobrir os custos de manter todas as crianças na escola.
Origem das grandes fortunas
No relatório deste ano, a Oxfam se debruçou também sobre a origem das grandes fortunas.
Segundo o levantamento, dois terços das fortunas estão ligadas à herança, monopólio e ao chamado capitalismo de compadrio. Nos próximos 20 anos, a expectativa é de que as 500 pessoas mais ricas do mundo deixem US$ 2 trilhões em herança para seus familiares.
“Além disso, quando a gente olha a relação das empresas com o estado e o capitalismo de compadrio, muitas empresas e bilionários têm a ver com a forma como são feitas as privatizações, com a corrupção, as influências para conseguir benefícios fiscais”, diz Katia. “É algo muito maior do que o esforço das pessoas em termos de trabalho, criatividade e inovação”.