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sexta-feira, novembro 8, 2024

Pela primeira vez no Brasil filho é registrado com duas mães biológicas, uma delas trans

Em decisão histórica, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) possibilitou, em 18 de agosto, que, a partir de agora, as gaúchas Ágata Vieira Mostardeiro e a ex-companheira possam registrar o filho de dois anos no cartório como ambas sendo as mães biológicas. A medida não é lei e não vale para outros casos, mas deve criar jurisprudência.

Ágata, 27 anos, professora, é uma mulher transgênero, que teve um relacionamento com uma moça de 28 anos. Elas tentavam, desde 2018, registrar o filho, de 2 anos, com o nome das duas, mas por Ágata se identificar como mulher trans não foi aceita como genitora biológica da criança na certidão de nascimento.

Ágata nasceu homem e participou da concepção do filho. Há mais de três anos, tem nome e sexo femininos registrados na carteira de identidade. Mesmo a criança tendo o DNA dela, o cartório incluiu, na época, em 2018, somente o nome da então companheira como mãe.

Na declaração de nascimento feita no hospital, os dados de Ágata também foram ignorados. De acordo com a advogada do processo, Gabriela Souza, a decisão do judiciário foi insatisfatória em 2018, já que, mesmo atendendo o pedido de registro, foi exigida a apresentação de atestado médico comprovando que Ágata não alterou o sexo biológico na época da concepção. “O registro somente seria autorizado com exame de DNA ou comprovação da possibilidade do filho ser gerado biologicamente, por mais absurdo que isso possa parecer”, explica Gabriela.

Na época do nascimento, um imprevisto também obrigou as duas mães a registrarem o filho apenas com o nome da mãe que o gestou na barriga, gerando uma série de burocracias. O recém-nascido ficou doente, e para fazer o plano de saúde era preciso a certidão de nascimento. Para isso, a então companheira de Ágata teve que assinar um documento declarando ausência de paternidade.

Um pouco depois da criança nascer, a lei de Registro Público foi alterada no Rio Grande do Sul. Ele veio ao mundo “mudando” uma legislação, modificada em setembro de 2018, que foi a fundamentação da sentença. “O filho ‘criou’ a lei que fez julgarem o processo dele”, pontua Gabriela.

Com tantas dificuldades, o caso virou uma ação judicial, com pedido de dupla maternidade. “Solicitamos a retificação do registro de nascimento dele para que fosse retirada a averbação de mãe socioafetiva da Ágata e para que ela fosse considerada mãe biológica, como de fato é”, diz a advogada.

“A decisão é histórica e demorou dois anos para ser executada. Ela mostra que as famílias existem não só na modalidade heteronormativa [pai e mãe heterossexuais] e deve criar novas leis”, diz Gabriela.

“O Estado, através dos cartórios, do Ministério Público e do Judiciário não podem usar a falta de conhecimento para disfarçar preconceitos e afrontar a dignidade da pessoa humana. Todas as famílias importam e não precisam seguir o modelo heteronormativo para que possam existir”, reforça.

STF autorizou em 2018 pessoas trans a mudarem registro

Em maio de 2018 o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou pessoas trans a mudarem o registro civil do primeiro nome e do sexo diretamente no cartório – sem a necessidade de entrar na Justiça ou de realizar cirurgia. Até janeiro de 2020, 6 mil travestis e transexuais foram beneficiados no Brasil, conforme a Associação dos Notários e Registradores (Anoreg).

Sobre Gabriela Souza

Gabriela Souza é advogada. Criou, em 2017, o escritório Gabriela Souza – Advocacia para Mulheres, o primeiro especializado em causas femininas no Rio Grande do Sul. Com metodologia própria, orienta e ajuda a derrubar o medo que as mulheres têm do Judiciário e do Direito por, historicamente, terem sido tratadas de forma desigual em uma sociedade machista, cujos direitos chegaram sempre depois para o público feminino.

Por Tatiana Bandeira/Padrinho Agência de Conteúdo

Cicero Omar da Silva
Cicero Omar da Silva
Chefe de Redação e Departamento de Vendas Portal ClicR e jornal Regional Cel/Whats: 51 99668.4901

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