Fusca precisa de manivela para dar partida e roda até hoje
Dentre as milhões de unidades que ainda rodam pelo Brasil, uma delas é excepcionalmente rara (por aqui e lá fora): um Fusquinha 1949, o mais antigo do país.
Essa peça histórica – de conservação impecável– está sob os cuidados de Jorge Cirne, capixaba apaixonado por carros antigos e o dono de uma coleção multinacional (que inclui até um Ford T 1919). E curiosamente, sua trama com o Fusca 1949 começou há menos de 20 anos pelo acaso.
Não, esse carro não era herança de família. Jorge já era colecionador do outros Besouros e tinha praticamente uma unidade de cada década. O primeiro foi um 1996 comprado de seu tio. “Aí apareceu a oportunidade de comprar um Fusca 1968, depois um da década de 1970, um 1953, que chamamos de split window, e um oval 1955”, relembra.
Encontro ao acaso
No final dos anos 2000, Jorge viu um anúncio de um motor de 1.131 cm³ da Volkswagen (que gerava 26 cv) em um leilão oferecido pelo Mercado Livre. Então, percebeu que se tratava de um propulsor extremamente antigo, pois essa versão foi descontinuada no início dos anos de 1950.
Neste dia, no entanto, Jorge tinha uma viagem programada com a família. Na época, sem smartphones ou redes de Wi-Fi, era bem mais difícil participar de eventos online sem dispor de um desktop. A solução foi entrar em uma lan house no aeroporto e, com a ajuda do filho, conseguiu arrematar o motor. O voo? Não deu para chegar a tempo. Prioridades.
“Quando arrematei o motor, falei com o proprietário e perguntei de qual carro ele era. Ele me contou que era de um Fusca 1949. Era um modelo extremamente raro, não conhecia nenhum 1949 no Brasil”, conta. O capixaba até tentou comprar o Besouro, mas o proprietário se negou a vender.
E para restaurá-lo?
Para sua surpresa, um ano depois o carro estava anunciado em um novo leilão do Mercado Livre. E o colecionador conseguiu arrematá-lo. Só que o veículo estava muito mal conservado, com profundas avarias. O reparo estouraria o orçamento. Depois de alguns meses guardado na garagem, o Fusca passou pelas primeiras reformas nas mãos de Jorge e de seu lanterneiro.
Foram feitos os primeiros trabalhos de funilaria e martelinho de ouro. A restauração começou a tomar forma.
Então, foram atrás das peças originais de fábrica – missão duplamente complicada em uma época em que as vendas online engatinhavam e a busca era por equipamentos para um Fusca sexagenário. Uma das soluções foi viajar até a Alemanha para garimpar peças para o carro. Todo o processo de restauração levou cerca de três anos.
Um ancião com corpo de atleta
O trabalho foi primoroso e o Fusquinha ficou impecável. Motor, chassi e carroceria são originais do veículo. O restante foi composto por componentes originais de fábrica. Ele traz algumas características históricas de quando foi produzido, como por exemplo a ausência de apliques cromados no carro.
Tanto a parte externa (carroceria, para-choques, calotas e maçanetas), como o painel são pintados da cor vermelho bordô – uma forma de baratear a fabricação do veículo. No painel, aliás, há somente um pequeno velocímetro e dois porta-luvas. Ele também não conta com espelhos retrovisores externos, somente um interno. Para dar partida no carro, era necessário o uso de uma manivela.
Ele foi produzido na época em que a Alemanha havia acabado de perder a 2ª Guerra Mundial e estava arrasada. Faltavam peças e era necessário produzir um automóvel acessível para o trabalhador. “O chamo até de Patinho Feio”, Jorge comenta.
História recuperada
Infelizmente, o passado do Fusca é desconhecido. O colecionador conta que até tentou buscar pelos antigos donos para resgatar a história do automóvel, mas não conseguiu. Anos depois da restauração, a própria Volkswagen chegou a emitir um atestado de autenticidade para o Fusquinha.
Existem rumores de que ainda existam outras duas unidades no Brasil que foram produzidas em 1949 em Wolfsburg. “Dos dois que falam que existem, um é de julho de 1949 e outro é de outubro. Já cheguei a procurar, mas de fato, nunca apareceu nada”, explica.