Condições meteorológicas ocorridas em novembro de 2020
Em novembro, as precipitações continuaram abaixo da média climatológica no Rio Grande do Sul (RS). Na maioria das regiões da Metade Sul do Estado, os totais acumulados ficaram entre 50 e 100mm (Figura 1 A). Já, em uma parte da Fronteira Oeste, os acumulados chegaram a ficar entre 100-150mm e, com isso, a anomalia de precipitação ficou positiva, ou seja, acima do normal.
Na grande maioria das regiões gaúchas, as anomalias de precipitação foram negativas, o que agravou a situação da estiagem no Estado. Por falar em estiagem, ela só amenizou com as chuvas do final de novembro (Figura 2) e com as que continuaram ocorrendo nos primeiros dias de dezembro.
Figura 1) Mapa da precipitação acumulada (A) e da anomalia da precipitação (B) durante o mês de novembro de 2020 em relação à média climatológica no RS. As escalas de cores indicam, em mm, o acumulado de precipitação (A) e a anomalia de precipitação (B), onde valores positivos (azul) indicam precipitação acima da média e valores negativos (laranja-vermelho) indicam precipitação abaixo da média. Fonte de dados: CPTEC/INMET.
A média mensal da temperatura mínima ficou dentro da normal climatológica em novembro. Já a média mensal da temperatura máxima ficou acima da normal, na maioria das regiões, com exceção da Zona Sul, que ficou dentro da normal. Pela Figura 2, observa-se que as temperaturas mínimas e máximas tiverem tendência de aumento ao longo do mês, o que é natural, pois já se aproxima do verão.
Dois picos com temperaturas mais baixas foram observados, um pelos dias 5 e 6 e o outro pelo dia 20 de novembro. Também, em dois episódios, a temperatura máxima superou os 35 °C. Dentre as seis regiões, a Zona Sul, representada por Santa Vitória do Palmar, é a mais fria. Na Figura 2 isso ficou em evidência, visto que em poucos dias as temperaturas ultrapassaram o valor da normal climatológica, tanto na máxima, quanto na mínima.
Figura 2) Temperatura máxima e mínima diária (°C), suas respectivas normais climatológicas (NC) (°C) e precipitação pluvial diária (mm) referentes a novembro de 2020, em alguns municípios da metade Sul do RS, que representam as seis regionais do Irga. Fonte de dados: INMET.
Situação atual do fenômeno ENOS (El Niño-Oscilação Sul) e perspectivas
Segundo o último relatório da NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), existe 95% de chance de a La Niña persistir no trimestre janeiro, fevereiro e março, sendo que esta probabilidade cai para 68% no trimestre março, abril e maio (outono). Ainda segundo a NOAA, o sistema acoplado oceano-atmosfera está consistente com a fase fria do ENOS (La Niña), indicando sua continuação.
Pelo mapa da anomalia da Temperatura da Superfície do Mar (TSM), observa-se que as águas do Oceano Pacífico Equatorial se mantiveram mais frias que o normal durante o mês de novembro de 2020 (Figura 3), caracterizando um evento La Niña de intensidade moderada.
Porém, a intensidade do resfriamento tem diminuído na região Niño1+2 e, se manter enfraquecendo ainda mais, a La Niña que, até então, que tinha característica canônica (resfriamento por toda a extensão do Pacífico de 50 ° a 180 ° Oeste, que causa déficit de chuvas no RS durante a primavera e verão), pode vir a apresentar características de uma La Niña Modoki (Modoki, na língua japonesa, significa “semelhante, mas não o mesmo”).
A La Niña Modoki é caracterizada por uma região com anomalia negativa de TSM no Pacífico Equatorial Central e por regiões com anomalias positivas de TSM a Oeste e a Leste da região com anomalia negativa. Não é exatamente o que se observa no momento, por isso está escrito que ela pode apresentar características Modoki. E quais seriam os impactos disso durante o verão?
Durante uma La Niña Clássica (Canônica), se observam anomalias negativas na precipitação, na região Sul do Brasil. Já durante uma La Niña Modoki, as precipitações tendem a ficar dentro do padrão normal. Ou seja, pode ser que durante os próximos meses se tenham alguns episódios de chuva, o que seria uma situação melhor que a do verão passado.
Outro fator que anima é a temperatura das águas do Oceano Atlântico Sul, que voltou a apresentar anomalias positivas. Quando o Atlântico Sul está mais aquecido, ele favorece as chuvas no RS, pois oferece maior quantidade de calor e umidade à essa região.
Voltando ao Oceano Pacífico, a região do Niño3.4, no último trimestre (setembro, outubro e novembro) teve anomalia de -1,2 °C, já no patamar de intensidade moderada. Com isso, ainda deve-se ter muita atenção, pois curtos períodos sem chuvas podem ocorrer, gerando algum impacto negativo na agricultura.
Durante o mês de novembro, as anomalias da temperatura da água nas regiões do Niño 1+2, 3, 3.4 e 4 estiveram em -0,7 °C, -1,2 °C, -1,3 °C e -0,7 °C, respectivamente. Os valores das anomalias diminuíram um pouco em relação ao mês de outubro, o que indica que a La Niña já deve estar perdendo força.
Figura 3) Anomalia da Temperatura da Superfície do Mar no mês de novembro de 2020. O retângulo central na imagem mostra a região do Niño3.4, a qual os centros internacionais utilizam para calcular o Índice Niño (índice que define eventos de El Niño e La Niña). Já o retângulo menor mostra a região Niño 1+2, que modula a qualidade, ou seja, a regularidade das chuvas no RS. Fonte: Adaptado de CPC/NCEP/NOAA.
Devido à atuação da La Niña, que mantém a atmosfera mais seca, temperaturas baixas serão mais comuns de ocorrer durante este verão, principalmente à noite. De qualquer forma, dias com temperaturas elevadas, próximas a 40 °C deverão ocorrer também, visto que o verão se inicia nesta segunda-feira, 21 de dezembro.
A temperatura das águas subsuperficiais também é monitorada e, desde agosto de 2020, a área com anomalias negativas tem aumentado de tamanho e magnitude (Figura 4), o que tem sustentado o resfriamento em superfície e a continuidade da La Niña.
Figura 4) Anomalia da temperatura subsuperficial das águas na região Equatorial do Oceano Pacífico (°C) em relação à profundidade (de 0 a 300 m). Pêntadas significam média de cinco dias consecutivos. Fonte: Adaptado de CPC/NCEP/NOAA.
Previsão da precipitação para janeiro, fevereiro e março de 2021
A frequência das chuvas aumentou nesta primeira quinzena de dezembro, devendo continuar até o restante do mês. Porém, ainda ocorre irregularidade na distribuição espacial e temporal das precipitações. Chove no sul do RS e não chove no norte e, até mesmo em uma mesma região, ocorrem chuvas mal distribuídas.
Além de ser uma característica do verão, isso fica um pouco mais acentuado por conta do resfriamento no Pacífico. Existe a tendência de que a frequência das chuvas continue em janeiro, porém deve-se fazer a ressalva de que a irregularidade espacial e temporal continuará.
Além disso, neste período do verão, a evapotranspiração aumenta, devido às elevadas temperaturas, o que piora a situação de possíveis períodos com deficiência hídrica. No boletim anterior, este aspecto foi melhor detalhado.
Janeiro: a maioria dos modelos converge para precipitações acima da média (Figura 5D). Pode ser que se tenha uma condição próxima a que está ocorrendo em dezembro/2020, com eventos de chuva mais frequentes. Porém, fica o alerta de que as chuvas podem não ocorrer de forma bem distribuída.
Fevereiro: O modelo do INMET indica condição de chuvas abaixo da média para a maioria das regiões do RS (Figura 5E). Já o modelo do CPPMET-UFPel indica chuva um pouco acima da média para a Metade Sul e dentro do normal nas demais regiões. Atenção para a irregularidade espacial e temporal das precipitações, a exemplo do que ocorreu nos meses de outubro e novembro, onde só choveu no final do mês. Fevereiro, climatologicamente falando, é o que apresenta maior volume de precipitação, se comparado a janeiro e março. Logo, esse pode ser um ponto positivo, se o volume de chuvas não ficar muito abaixo da média climatológica (Figura B).
Março: alguns modelos indicam chuvas abaixo da média para a maioria das regiões (Figura 5F). Já o modelo do CPPMET/UFPel indica chuva abaixo da média para as regiões da Fronteira Oeste, Campanha, parte da Zona Sul e parte da região Central, com as demais regiões ficando com precipitações dentro da normalidade.
Figura 5) Normal climatológica da precipitação para os meses de janeiro (A), fevereiro (B) e março (C) para o RS (referente ao período 1981-2010). Os mapas (D), (E) e (F) representam se a precipitação ficará acima (verde), abaixo (laranja) ou dentro da normal (cinza), nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2021, respectivamente. Fonte de dados meteorológicos: INMET. Confecção e arte dos mapas: Jossana C. Cera.
Como recomendação, fica, ainda, o alerta para economia de água, tanto no campo quanto na cidade, visto que o déficit hídrico ainda é grande. De modo geral, o estado é de atenção! Com isso, faz-se, novamente, a ressalva de que as chuvas ainda ocorrerão de forma irregular no RS. Por vezes, pode ocorrer eventos de chuva muito curtos e com altos acumulados, podendo gerar danos às lavouras e depois, ainda, ficar 15-20 dias sem chuva.
Jossana Ceolin Cera é meteorologista, doutora em Engenharia Agrícola pela UFSM e consultora do Irga.